7.17.2006

Deixarei os jardins a brilhar com seus olhos (Herberto Helder)


©mra

Deixarei os jardins a brilhar com seus olhos detidos: hei-de partir quando as flores chegarem à sua imagem. Este verão concentrado em cada espelho. O próprio movimento o entenebrece. Mas chamejam os lábios dos animais. Deixarei as constelações panorâmicas destes dias internos.Vou morrer assim, arfando entre o mar fotográfico e côncavo e as paredes com as pérolas afundadas. E a lua desencadeia nas grutas o sangue que se agrava.Está cheio de candeias, o verão de onde se parte, ígneo nessa criança contemplada. Eu abandono estes jardins ferozes, o génio que soprou nos estúdios cavados. É a cólera que me leva aos precipícios de agosto, e a mansidão traz-me às janelas. São únicas as colinas como o ar palpitante fechado num espelho. É a estação dos planetas. Cada dia é um abismo atómico.E o leite faz-se tenro durante os eclipses. Bate em mim cada pancada do pedreiro que talha no calcário a rosa congenital. A carne, asfixiam-na os astros profundos nos casulos. O verão é de azulejo. É em nós que se encurva o nervo do arco contra a flecha. Deus ataca-me na candura. Fica, fria, esta rede de jardins diante dos incêndios. E uma criança dá a volta à noite, acesa completamente pelas mãos

4 Comments:

Blogger José Pires F. said...

Um texto maravilhoso, como o são tantos de Herberto Hélder.
A frase inicial é simplesmente sublime.

Um abraço.

10:57 da manhã  
Blogger Ana Cristina Pinto said...

Sem dúvida um texto fantástico aliado a uma foto poderosa.
As palavras combinam perfeitamente com a imagem.
Obrigada pela visita ao meu blog.Volta sempre.

1:07 da manhã  
Blogger MRA said...

Obrigado piresf e á afeiticeira (moramos na mesma cidade...)

6:10 da manhã  
Blogger MRA said...

Caldas

6:10 da manhã  

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